22 de jan. de 2020

No coração do mar (Nathaniel Philbrick) – DLLC 2020


Título: No coração do mar
Autor: Nathaniel Philbrick
Mês: Janeiro
Tema: Um livro com uma aventura em alto-mar
Editora Companhia das Letras, 371p.

Sem se mover mais para trás, o Essex agora ia direto para baixo. A baleia, havendo subjugado o seu estranho adversário, desembaraçou-se das lascas das tábuas estraçalhadas do casco, revestido de cobre, e nadou para longe, para sotavento, e nunca mais foi vista.

Em 20 de novembro de 1820, em algum ponto do Pacífico Sul, o navio de Nantucket, Essex, foi abalroado por uma baleia que nunca mais foi vista depois desse ataque. Esse é o resumo de um dos desastres marítimos mais famosos do século XIX, que inspirou a escrita de Moby Dick, de Herman Melville.
Nantucket era uma ilha norte-americana cuja economia se baseava totalmente na caça às baleias, e por isso se transformou, na época, no maior polo mundial do comércio de óleo, utilizado como combustível para iluminação e como lubrificante nas novas indústrias. Graças a esse mercado, os baleeiros começaram a explorar mares desconhecidos.
O Essex saiu de seu porto no dia 12 de agosto de 1819, numa viagem que o jovem Capitão Pollard Jr. esperava que fosse curta e esperançosa, mas que se revelou um completo desastre e custou a vida da maioria dos homens sob seu comando. As marcas psicológicas deixadas por esse acontecimento na vida dos sobreviventes permaneceu com eles suas vidas inteiras e só acabou vindo a luz a partir dos relatos do primeiro imediato Owen Chase e do jovem marinheiro Thomas Nickerson.

Assim como quando eu vi o filme, esse livro me deixou com sentimentos mistos. Desde a primeira vez que ouvi falar da história da baleia que atacou um navio baleeiro, fiquei apaixonada por essa história. Fui atrás, li Moby Dick, vi a adaptação (filme bem antigo) e na época, eu queria fazer oceanografia e me juntar ao Greenpeace para salvar as baleias dos japoneses. Foi um choque, anos depois, quando descobri que a história de Melville se baseava em uma história real, e é sobre isso de que se trata esse livro, sem dúvida um dos melhores da minha lista de leituras em 2020 (duvido que essa minha observação seja precipitada). A leitura prende do início ao fim, mesmo com as descrições históricas da época, que para alguns pode ser cansativo, mas ajuda muito a entender a importância do comércio do óleo da baleia.
As descrições fornecidas sobre o processamento do óleo podem ser meio nojentas, por falta de palavra melhor, principalmente se você tem em mente a cena em questão do filme, mas também mostram o que faziam com o cadáver da baleia, porque a primeira vista se pensa “se eles estavam interessados no óleo, o que acontecia com o restante do animal?”.
A medida que se vai lendo, se percebe o nível dos problemas pelos quais eles passaram, devido às decisões equivocadas dos “líderes” do navio, devido as ações mal executadas dos próprios homens, ao ponto de que se pensa que o que acontece com o Essex e os extremos a que eles chegam para sobreviver não passam de castigo divino. Foi exatamente essa a sensação que tive quando cheguei nessa parte:

O Essex deixou uma marca permanente na ilha. Quando Nickerson voltou lá anos depois, ainda era uma devastação enegrecida. “Onde quer que o fogo houvesse ardido, não cresceram árvores, mato nem capim”, relatou ele. A ilha Charles foi uma das primeiras das Galápagos a perder sua população de tartarugas. Embora a tripulação do Essex já tivesse cumprido muito bem a sua parte na redução da população mundial de cachalotes, foi ali, naquela minúscula ilha vulcânica, que deram sua grande contribuição para a erradicação de uma espécie animal.

O livro não poupa detalhes sobre o que aconteceu com os ocupantes do Essex depois do naufrágio, apontando as decisões equivocadas de seu capitão, o preconceito reinante (e devo dizer que mesmo disfarçado, era muito presente) na mente dos naturais de Nantucket que coincidiu depois na forma como, coincidentemente ou não, os sobreviventes foram tratados durante os momentos mais cruéis do tempo em que passaram perdidos no mar.

Só um natural de Nantucket, em novembro de 1820, possuía a necessária combinação de arrogância, ignorância e xenofobia para esquivar-se de uma ilha convidativa (embora desconhecida) e optar por uma viagem de milhares de milhas em alto-mar.

É interessante notar que devido as condições do correio na época e ao fato de que uma viagem dessa durava mesmo muito tempo, as novidades sobre o que acontecera com o Essex e seus tripulantes demorou para chegar em Nantucket, então as pessoas não se apavoraram. A volta do capitão Pollard após seu resgate exigiu um relato do acontecido aos donos do navio, mas o assunto meio que se tornou não mencionável devido ao caráter do comércio e a própria fama da cidade em ser o centro do comércio de óleo baleeiro. Owen Chase foi um dos responsáveis pelo relato do ataque e da vida dos sobreviventes no mar, mas ele acaba por omitir muita coisa.


Thomas Nickerson, o tripulante mais novo e camareiro do Essex, anos mais tarde também escreveu um relato sobre o naufrágio e, apesar de conter informações que não estão presentes na narrativa de Owen, ele também adapta o relato aos seus próprios fins.


Resumindo, esse livro é excelente. Um relato vívido e talvez não tão perturbador quanto os citados acima, mas que não fica atrás de nenhum dos dois. Completamente recomendado.

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