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9 de dez. de 2020

Os Romanov (Robert K. Massie) – DLL 2020


Título: Os Romanov: o fim da dinastia
Autor: Robert K. Massie
Mês: Dezembro
Tema: Um livro que você ganhou
Editora Rocco, 269p.

Na madrugada do dia 17 de julho de 1918, Nicolau, Alexandra e seus cinco filhos foram acordados por Yakov Yurovsky e notificados que deveriam ir se esconder no porão da casa onde estavam porque a cidade estava agitada e eles corriam risco de serem atingidos caso houvesse tiroteio nas ruas. Obedecendo as ordens, o czar e sua família se dirigiram ao porão e junto com eles foram o médico da família Eugene Botkin, o valete de Nicolau, Trupp, a camareira de Alexandra, Demidova e o cozinheiro Kharitonov.

“Tendo em vista o fato de que seus parentes continuam a atacar a Rússia Soviética, o Comitê Executivo do Ural decidiu executá-los.”

O que se seguiu foi o assassinato de Nicolau, Alexandra, seus filhos e funcionários. Alguns morreram na hora, outros foram mortos com mais brutalidade e perda de controle por parte dos carrascos. Vendo que a execução não tinha saído como planejado, Yurovsky se apressou a dar fim nos corpos. Desfigurados, despidos e roubados (as grã-duquesas haviam costurado suas jóias dentro dos corpetes), os mortos foram jogados na mina mais profunda na área conhecida como Quatro Irmãos e detonaram a entrada da mina com bombas.
Quando Yurovsky voltou a Ekaterinburg, encontrou a cidade fervilhando de comentários sobre o assunto. Com o Exército Branco se aproximando, decidiu que precisava enterrar os corpos em um novo local. Retirar os corpos da mina, escolher um novo local e dar um sumiço mais permanente nos corpos levou todo o dia 18 de julho até que na madrugada do dia seguinte:

o veículo ficou definitivamente atolado. Já que não chegaríamos até as minas profundas, só podíamos enterrá-los ou queimá-los. Queríamos queimar Alexei e Alexandra Feodorovna, mas, por engano, em vez dela queimamos sua dama [Demidova] e Alexei. Enterramos os restos ali mesmo, sob a fogueira, jogamos pás de argila por cima dos restos, acendemos outra fogueira no local e espalhamos as cinzas e brasas, a fim de cobrir totalmente os vestígios da cova. Enquanto isso uma vala comum era cavada para os outros. Por volta das sete da manhã, outra cova de dois metros de profundidade com dois e meio metros quadrados estava pronta. Os corpos foram colocados no buraco e ensopados fartamente com ácido sulfúrico de modo a não serem reconhecidos e impedir qualquer odor de decomposição. Enchemos de galhos e de cal, cobrimos com madeira e passamos o caminhão por cima diversas vezes – até não restar vestígio do buraco. O segredo foi bem guardado – os Brancos não encontraram o local do sepultamento.

Em 1919, um investigador jurídico descobre resquícios de objetos pessoais da família e ossos calcinados durante uma escavação nos Quatro Irmãos, mas dada a situação no país, Sokolov só publica seus achados em 1924, no livro Inquérito judicial sobre o assassinato da família imperial russa, que se torna um relato oficial do assassinato da família imperial e obriga o governo soviético a mudar a história sobre o destino da imperatriz e seus filhos, que ainda eram acreditados como vivos, mas escondidos. A partir daí, se sucedem investigações em busca dos ossos e exames para reconhecer e enfim dar um destino digno aos restos mortais dos últimos Romanov.

Publicado em 1968, The Sokolov investigation, de autoria de John F. O'Connor, traduz do russo partes do livro de Sokolov, Inquérito judicial sobre o assassinato da familia imperial russa.

A primeira coisa que devo dizer sobre esse livro é que: os nomes mais importantes nele não são de Nicolau ou Alexandra ou de suas filhas e seu filho, mas sim dos investigadores que descobriram, analisaram e escreveram sobre a descoberta e reconhecimento dos corpos encontrados em uma cova secreta em Ekaterinburg. São eles:

-Nikolai Sokolov, investigador jurídico que iniciou em janeiro de 1919 uma investigação sobre o paradeiro da família real com a permissão do “Chefe Supremo” do Governo Branco da Sibéria;
-Alexander Avdonin,e Geli Ryabov, ambos interessados na “mistério” da morte dos Romanov que descobrem a cova onde os corpos foram enterrados e encontram alguns crânios;
-Sergei Abramov, cuja equipe conseguiu identificar sem DNA os mortos, com exceção de Maria e Alexei, cujos esqueletos faltavam;
-William Marples, criador do Laboratório de Identificação Humana da Universidade da Flórida, cuja equipe também examina os esqueletos e constata que quem falta é Anastásia, ao invés de Maria;
-Peter Gill, responsável pelos testes de DNA que identificaram os esqueletos com mais precisão.

Robert K. Massie faz um excelente relato sobre o assassinato dos Romanov, a descoberta dos restos mortais e a investigação em busca da confirmação das mortes. Ele mostra que Moscou não somente sabia do assassinato da família inteira, mas aprovava e também ocultou informações sobre o assunto do resto do mundo. Ele não somente cita os primeiros investigadores que descobriram a cova e as ossadas em 1979, Avdonin,e Ryabov, mas relata o processo da descoberta, o pacto que fizeram de não mencionar nada e mais tarde, a quebra desse pacto. Ele faz um apanhado da história soviética e como as mudanças políticas permitiram que fossem feitas investigações mais profundas para se encontrar todos os esqueletos e se reconhecer as pessoas a quem eles pertenciam.

Casa de Ipatiev, onde a Nicolau e sua família ficou de abril a julho de 1918 e onde foram assassinados. A casa foi destruída em 27 de julho de 1977, depois que o lugar havia se transformado em um local de peregrinação.

Achei essa parte a mais interessante (e um pouco macabra, dado o relato do estado dos ossos) do livro por conta da descrição completamente detalhada que Massie faz. Ele fala da confusão entre Abramov e Marples e suas discordâncias sobre os esqueletos faltantes. Gostei da abordagem objetiva sobre as implicações políticas, e mais importantes, familiares de levar os ossos dos Romanov para um laboratório forense em Aldermanston, na Inglaterra, por conta de testes de DNA para se identificar as pessoas a quem os esqueletos pertenciam.
Foi bom ver que ele abordou outras questões: o que houve com a Casa de Ipatiev, as reações do povo de Ekaterinburg e a posição da Igreja Ortodoxa Russa:

Paralisada por 75 anos de submissão ao Estado ateu, a Igreja Ortodoxa Russa ainda peleja para achar um meio de lidar com a execução dos Romanov. Se morreram como mártires, deveriam ser canonizados como santos – como de fato foram pela Igreja Ortodoxa Russa no Exterior, em 1981. Ainda que Nicolau e sua família não fossem considerados vítimas de martírio e merecedores de canonização, mas simplesmente vítimas de um assassinato político, a igreja se sentia na obrigação de levar em conta sua morte violenta. (Mesmo não tendo considerado o assassinato do czar Alexandre II, em São Petersburgo, em 1881, um martírio, a Igreja Ortodoxa Russa construiu no local a Catedral do Sangue para perpetuar a memória do czar.) 
Mesmo antes da exumação dos esqueletos de Ekaterinburg, o arcebispo local queria erguer uma igreja memorial na área da Casa de Ipatiev. “Este é o lugar onde começou o sofrimento do povo russo”, afirmou o arcebispo Melkhisedek. A igreja seria chamada Catedral do Sangue Derramado para “simbolizar a penitência da sociedade e expurgar as ilegalidades e as repressões desmedidas que foram infligidas durante os anos do bolchevismo”.[...]

Um assunto sobre o qual Massie se debruça é a questão da briga entre Moscou e Ekaterinburg pelo controle dos ossos dos Romanov, e o papel de Vladmiri Soloviev, um procurador-criminologista que tratou a investigação como processo criminal, e passou a querer tanto a determinação final sobre as identidades dos restos mortais quanto ao paradeiro das duas crianças que faltavam. O autor dedica a segunda parte do livro para falar dos impostores que surgiram alegando serem as crianças desaparecidas, sendo a mais famosa impostora Anna Anderson ou Franziska Schanzkowska (dentre outros nomes).
De muitas formas, esse livro acabou sendo bem diferente do que eu esperava. Ganhei ele ano passado num sorteio deste desafio, e o engraçado é que quando coloquei ele na estante do skoob, achei que seria mais uma biografia sobre os Romanov. Acabei com o relato sobre todos os passos da investigação para se descobrir os restos mortais da família, o que foi muito mais interessante. Essa minha resenha acabou ficando enorme justamente por causa disso, é tanta informação, tanto detalhe que me deu vontade escrever e escrever mais para fazer com que todo mundo tenha vontade de ler. Um dos melhores livros que li esse ano, completamente indicado.

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